segunda-feira, 14 de abril de 2014

14 Conseguir


ser-se. Sem limitações. Entrar numa loja e escolher aquela peça cliché que nunca usaríamos, pensávamos nós. Colocar seja aquilo que for na mala. Uma lingerie bonita, um perfume irresistível, uma peça de roupa inconfundível. Conseguir ser-se. Sem limitações.

Chegar ao bar. Pedir uma bebida. Um wisky para queimar as velhas memórias e ressuscitar as novas. Um espelho à frente, que faz da decoração do bar, dá um incentivo para olharmos. Conseguir ser-se. Olhar-se e sentir-se. Percebemos que afinal algum brilho existe e que afinal os dias para nós são todos iguais porque queremos. A dose do wisky chega ao fim. Do lado está um cavalheiro de smoking. Sentes-te capaz. No final da noite, ele deixa o seu cheiro nos lençóis da cama do hotel. Tu acordas, a presença dele... não te faz diferença. Porque tu sentes-te. Perguntas-te como todos os teus amores foram verdadeiros campos de guerra quando num momento glorioso de pura adrenalina plantaste uma flor. Tu achas-te. Por momentos, és qualquer coisa. Conseguiste arriscar. 

Vestes aquela peça de roupa inconfundível. Colocas, de novo, o batom roxo. Sais de salto agulha do hotel. Vais tomar o pequeno almoço e reparas: hoje o dia é o mesmo, a tua sintonia interior é que se transformou numa fénix, uma metamorfose bonita como uma borboleta rara... Uma sensação de que a partir de agora irás andar a procura da perfeita repetição.

Hoje em dia tu compras batons e tu usas. Tu desfrutas de peças inconfundíveis. Saltos agulha. Tu gostas daquele homem por momentos e consegues infatigavelmente imaginar-te a beija-lo. Tu reconheces que o cheiro dos teus lençóis é capaz de convence-lo a algo mais. A tua vida é conseguir ser-se. E, nada mais interessa nesta merda toda. 

4 comentários: